Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A popularização dessas tecnologias no país teve impulso durante a realização de megaeventos, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016
Uma pesquisa divulgada nesta quarta-feira (7) pela Defensoria Pública da União (DPU) em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) revela que o Brasil conta atualmente com ao menos 376 projetos de reconhecimento facial em operação, capazes de vigiar cerca de 83 milhões de pessoas — o equivalente a 40% da população. Intitulado Mapeando a Vigilância Biométrica, o relatório alerta que a popularização dessas tecnologias no país teve impulso durante a realização de megaeventos, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Desde então, sistemas de reconhecimento facial têm sido amplamente utilizados por forças de segurança pública, muitas vezes sem regulamentação clara, mecanismos de controle ou transparência na aplicação.
Investimentos milionários e ausência de regulação agravam riscos
A pesquisa aponta que os projetos já movimentaram pelo menos R$ 160 milhões em investimentos públicos, valor estimado com base nas informações fornecidas por 23 dos 27 estados. Quatro não responderam: Amazonas, Maranhão, Paraíba e Sergipe. Mesmo com esse avanço tecnológico, o Brasil ainda carece de uma legislação específica que regule o uso dessas ferramentas, o que, segundo os pesquisadores, aumenta o risco de violações de direitos, erros graves e uso discriminatório. A ausência de padrões técnicos uniformes, controle externo e transparência preocupa especialistas. Segundo o relatório, mais da metade das abordagens motivadas por reconhecimento facial no país resultaram em identificações equivocadas — em sua maioria, de pessoas negras.
Casos de erro e discriminação acendem alerta sobre uso abusivo
Um dos casos mais emblemáticos ocorreu em abril de 2024, quando o personal trainer João Antônio Trindade Bastos, negro, foi conduzido por engano por policiais militares durante uma partida no estádio em Aracaju (SE). Identificado erroneamente como um foragido, ele foi revistado e interrogado até que sua identidade fosse confirmada. O episódio gerou repercussão nacional e levou o governo de Sergipe a suspender o uso do sistema pela PM local. O levantamento do CESeC identificou 24 casos de erro em sistemas de reconhecimento facial entre 2019 e abril de 2025. Os pesquisadores destacam que os sistemas apresentam taxas de erro desproporcionalmente maiores para negros, indígenas e asiáticos, sendo de 10 a 100 vezes superiores em comparação a pessoas brancas.
Projeto de lei avança, mas proposta ainda preocupa especialistas
Apesar da urgência, a regulamentação ainda está em discussão. Em dezembro de 2024, o Senado aprovou o Projeto de Lei nº 2338/2023, que trata do uso da inteligência artificial na segurança pública. A proposta segue para análise da Câmara dos Deputados, que criou uma comissão especial para debater o tema. Embora o PL preveja restrições ao uso da tecnologia em tempo real e em locais públicos, os pesquisadores alertam que o número de exceções contempladas no texto é tão grande que, na prática, a norma funcionaria como uma autorização ampla para o uso das TRFs.
Pesquisadores pedem regras claras, transparência e controle social
O relatório defende a criação urgente de uma lei nacional específica para regulamentar o uso do reconhecimento facial no Brasil, com protocolos técnicos padronizados, auditorias independentes e transparência nos contratos públicos. Também propõe que haja autorização judicial prévia para uso de dados em investigações, limite para armazenamento de dados biométricos e controle mais rigoroso sobre empresas privadas que operam esses sistemas.
“O relatório evidencia tanto os vieses raciais no uso da tecnologia quanto problemas de mau uso de recursos públicos e falta de transparência na sua implementação”, afirma Pablo Nunes, coordenador-geral do CESeC. Segundo ele, os achados devem orientar o debate público e influenciar a tramitação do projeto de lei no Congresso.
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Postado por Sônia da Conceição Santos, no dia 07/05/2025 - 19:20